VENTOS DE DESTRUIÇÃO
O relato, impressionante, de Adelino Serras Pires que nos conta a história da sua vivência venturosa, onde no contexto da excelente obra deparamos com uma história de vida que insere: o pioneirismo, a caça grossa, o renascimento e desenvolvimento do turismo genético, selvagem, em Moçambique; o dinamismo; a glória, o humanismo;a desventura; a prisão com tortura e a conspiração.
A obra de Adelino Serras Pires e de Fiona Claire Capstick ( B - Bertrand Editora – Chiado 2002 – e-mail editora@bertrand.pt ) chegou-me hoje, dia 3 de Fevereiro de 2006, autografada pelo Adelino.
Graças à Internet e uma pequena referência que escrevi numa comunicação ao Fernando Gil, também um amante de Moçambique, foi possível o Adelino localizar-me na Tailândia.
Não tardou comunicar comigo por e-mail; falou-me do seu livro e transmitiu-me que me iria enviar um exemplar.
…..paquete Quanza: num frio e húmido dia de Novembro de 1936
Conheci de perto o Adelino; a sua dinâmica actividade empresarial e sua prestigiada família: Serras Pires.
A obra de Adelino Serras Pires é a persistência de um Homem que chegou, acompanhado de Mãe, duas irmãs e um irmão, embarcados no paquete Quanza: num frio e húmido dia de Novembro de 1936.
Uma família como muitas outras que partiam da metrópole para se juntar ao chefe de família que anos antes tinha partido, talvez, dentro do espírito, característico do português aventureiro ou em procura de uma vida melhor.
A criança Adelino a bordo do Quanza penetrou num mundo estranho: na escala no porto Funchal observou os rapazes que aguardavam, mantendo-se a flutuar na água junto aos casco do grande navio esperando que os passageiros lhe deitassem uns cinco ou dez tostões lá do cimo do convés à água que não os deixavam chegar ao fundo.
O patriarca da família, José Serras Pires A D. Maria a dama gentil que conheci há 40 anos
Passou a linha do Equador, viu os peixes voadores, nas águas quentes do Atlântico, aos bandos que naqueles saltos de metros em arco prateado se caldeava com o azul das águas do Atlântico, ofereciam ao olhos de uma criança de 8 anos, um espectáculo belo e antes imaginado.
Nos portos de escala do “ronceiro” Quanza, na costas ocidental e oriental de África o pequeno Adelino do alto do Quanza olha a lide que seguia no cais de carga e descarga. Chegou à Beira e partiu para a cidade de Tete, o antigo “Cemitério dos Brancos”. A selva às portas da cidade; o rugir dos leões; os hipopótamos mergulhados na corrente do rio Zambeze; os crocodilos a tomarem banhos de sol nas pequenas restringas daquele majestoso caudal; as aves carraceiras posadas no lombo dos búfalos e do gado bovino, cafreal, catando os insectos.
O Adelino, nascido em Ponte Sôr, a selva moçambicana; os animais selvagens, a passarada; as picadas ladiadas de capim de dois e mais metros foram amores à primeira vista. Conheceu a selva de África no seu todo, aprendeu a viver dentro daquele matagal, virgem, imenso. Foi o impulsionador e o pioneiro do turismo para a caça grossa em Moçambique. Organizou, comparticipou e acompanhou, como caçador guia, figuras a todos níveis sociais do mundo da época: James Lowell, comandande da Apollo 13; Charlie Duke, comandante da Apollo 16; Stu Rosa, comandante da Apollo 14; Giscard d´Estaing, presidente de França e muitas outras individualidades, mundialmente, conhecidas.
1- Stu Rosa, Comandante da Apollo 14; 2 e 3-Adelino Serras Pires; 4-Dottie Duke, Carnaval, 5-pisteiro, 6-Charlie Duke, Comandante da Apollo 16.
Hoje o Adelino está nas capitais da Europa, no dias que se seguem nos países da América a promover Moçambique não só as potencialidades genéticas como o turismo. Regressa à base e aí está ele acompanhar gente proeminente nas picadas na procura de conquistar o troféu de caça que sonhou e levá-lo para o seu país como prémio. Eles são os futuros divulgadores de todas as potencialidades que a denominada “Pérola do Índico” encerrava e com isto a vinda de mais amantes da caça grossa e outros para se deliciarem nas praias da longa costa moçambicana.
Adelino Serras Pires e toda a sua família, perderam tudo construído em Moçambique, obra iniciada por seu Pai, José Serras Pires, na década trinta do século passado. Um tudo que não era uma riqueza de:por aí além… mas o fruto de muita vontade de levar para a frente coisas boas para a terra moçambicana e inseri-la, no mapa, como país de imensas belezas naturais no contexto das nações do ocidente como um destino, turístico a conhecer e a recomendá-lo depois, os visitantes, do regresso ao ponto de partido.
“O Homem sonha e a obra nasce”! Os deuses acolhem-nas e benzem-nas; o Diabo destroi-as como acto de conspiraria porque é adverso às obras que os deuses acolhem e protegem.
Ventos cortantes vindos de países do gelo, fizeram enregelar a selva, calar vozes das savanas, desertas as praias sem turistas; os hotéis voltaram guetos e “pardieiros” e locais de abrigo de gente pobre que não teve outra alternativa de ocupar, porque o Governo, de Moçambique, implantado, de “mão-beijada” após a “tal” revolução da liberdade levada acabo em Portugal, não teve “miolos” do saber governar o sacrificado Povo, desde que a “cambada” liderada pelo defunto, de má memória, Samora Machel, açambarcou o Poder o esmagou com a “pata”, não só os seus irmãos de raça como as outras etnias que viviam em em Moçambique.
Grande Hotel da Beira: antes da independência de Moçambique - actualmente um: “pardieiro”
Outros heróis, da liberdade e de “pacotilha” que com oportunismo andaram exilados em países onde a liberdade era coisa vã, aproveitaram-se daquele “tal” dia onde, a G3, em vez de dar tiros, serviu de floreira e suporte de cravos vermelhos. Foi o dia da alegria e da elogia dos poetas com a “trampa” de poemas como que armados em Camões do século XX ! Comei, comei e digeri poemas, portugueses,de poetas “capados” , porque os nossos cantos também vos alimenta o cérebro e enchem de ar e vento os vossos estômagos.
“Grande Hotel da Beira” gueto de pobres Um industrial de “remendos” dos pobres (Grande Hotel)
Surgem, além dos poetas, outros oportunistas depois do “tal” 25 de Abril, que, antes, na vida nunca souberam o que era “vergar a mola” e polir cadeiras, com os fundilhos das calças , onde se sentaram.
“Chulos” vigaristas;contrabandistas; golpistas, imbecis e mediocres surgem de todos os lados à espera da primeira oportunidade para entrar na contenda. Entraram, decoraram-se de fato e gravata, cabeças ocas; pavanearam-se; lautearam-se à conta do contribuinte e semearam vaidade humana por todos os cantos de ruas; botaram discurso de “trampa” mal-cheirosa que foi estrume que não fez germinar a semente, por eles lançada, em terra seca.
Liberdade para alguns e outros que a perderam. Foi este o “Dia da Liberdade”
Hoje, segundo notícias que me chegam Moçambique é um país destruído!
Depois da saída dos “tais” colonialistas portugueses por lá ficou a fome, a morte prematura dos moçambicanos; o retrocesso do desenvolvimento; as propriedades abandonadas e as cantinas do mato sem pano, para permutar com mandioca, milho, meixoeira, mapira e vestir essa gente humilde e boa. Antes de aparecer a FRELIMO, em Moçambique não havia pretos e brancos maus.
As duas raças viviam harmoniosamente lado a lado. Pão, outra comida e água de Lisboa nas cantinas e um centro de enfermagem, nas proximidades para acudir um doente.
O terror depois da independência foi imposto, mercê dos instintos de malvadez de que foi dotado um “tal” camarada, bossal, Samora Machel. Uma “besta” humana que a ele se aliaram e apoiaram outras “bestas” execráveis, brancas e pretas que mais não produziram com a independência do território a destruição do generoso Povo. Mais ainda um fosso de doenças, incontroláveis, onde impera a SIDA, a dor e a morte lenta de milhares de inocentes que se finam sem saber porque razão.
Os torturados nas “masmorras” de Samora Machel à chegada ao aeroporto de Lisboa. Da esquerda para a direita: Caju, Tim-Tim, Rui e Adelino Serras Pires
As sementes diabólicas do ódio lançadas à terra pela FRELIMO, contra o homem branco, nunca germinaram!
As ambições tribais de meia dúzia de cabecilhas fizeram com que a “Pérola do Índico” voltasse numa pérola “farrusca” sem préstimo que possa produzir qualquer adorno.
Lourenço Marques outras cidades do sul ao norte eram localidades onde tranquilidade era constante. Hoje as pessoas, brancas ou pretas já não podem passear de noite ou dia em paz. Há sempre um “mabandido” nas proximidades, igual a uma “mamba negra” para as atacar traiçoeiramente; roubá-las e lhes tirar a vida.
É este, o Moçambique do momento, e pouco, mesmo nada se haja modificado desde quando o “peniqueiro” do Hospital da Beira, Samora Machel, após a independência, fazia encher o estádio de Lourenço Marques e à multidão vociferava em voz grutural: cada moçambicano deve matar 30 moscas por dia para eliminar a “moscarada” em Moçambique!
E prosseguia: os camaradas vão deixar de morar nos quintais da cidade mas sim nos apartamentos do Maputo e, recomendava: não levem o “pilão” a cabra e a galinha!
Muitos dos pilões calaram-se porque já não há milho e mandioca nas “machanbas” que chegue para todos para produzir farinha, fina e branca de neve.
Adelino Serras Pires no seu livro “Ventos de Destruição” descreve a dramática situação, desumana, de detido na Tanzãnia e Moçambique, juntamente com seu filho, sobrinho e um parente. Vale a pena mencionar e meditar: que neste mundo há homens que não são humanos, paridos, mas animais selvagens e mais do que aqueles que vivem na selva africana onde estes, sendo selvagens, conservam a honra que só molestam o Homem quando atacado por ele e agem dentro do instinto de defesa.
O PRELÚDIO a introdução da Obra escrito pelo Adelino Serra Pires bem nos dá conta da ignóbil selvajaria a que os quatro homens foram sujeitos:
“ Não conseguia andar. Os meus pés eram balões que enegreciam rapidamente num inchaço de agonia, isto porque tinha os tornozelos bem amarrados com câmaras-de-ar de pneus de bicicleta. As mãos eram dois bulbosos montes de fogo, com os pulsos também apertados com tiras de borracha. Estava vendado e desclaço quando fui empurrado e arrastado para fora de veículo.
O som dos motores a jacto disse-me que estávamos a ser conduzidos para um aeroporto. Fui obrigado a subir alguns degraus com um membro da polícia secreta tanzaniana de cada lado, metido num avião e atirado para um assento onde me removeram a venda. Sentado à minha frente encontrava-se o meu filho, Adelino Jr., mais conhecido por Tim-Tim, o meu sobrinho Carlos Artur, conhecido por Caju, e um colega caçador português, também meu parente, Rui Monteiro. O horror que vi nos seus rostos é algo que gostaria de apagar das minhas recordações daquele dia terrível, 29 de Agosto de 1984, na Tanzânia.
Levantámos do aeroporto de Quilimanjaro. Encontrava-me numa tal agonia, a gritar de dor por causa das borrachas que me apertavam cada vez mais as mãos e os pés, que pensei que iria acabar por morrer. O meu filho e os outros conseguiram convencer os patifes, que seguiam a bordo do avião especial, fornecido por Julius Nyerere, o presidente da Tanzânia, a cortarem-me as ataduras de borracha. O sangue começou novamente a fluir para as minhas extremidades, as dores aumentaram e senti-me à beira da perda da consciência. O meu filho esfregou-me as mãos numa desesperada tentativa de impedir aquilo que mais temíamos, a grangrena.
O aparelho ganhou altitude, e todos nós pensámos que nos dirigíamos para o porto marítimo tanzaniano de Dar-es-Salam. É irónico recordar, quando escrevo estas linhas, que esse nome significa <<abrigo de paz>>... numa altura em que todos nós nos encontrávamos às portas do inferno. Encontrava-me virado para a traseira do avião, quando reparei que o Sol passara a estar numa posição errada. Via-o à minha direita, o que significava que se encontrava à esquerda do jacto. Íamos para sul, para Moçambique. Isso só podia significar uma coisa: estávamos prestes a ser postos nas mãos da Polícia Secreta Moçambicana.
O meu filho Caju e o Rui haviam sido cercados e presos no meio de um safari com um casal americano do Texas. Eu fora detido subitamente no hotel, em Atusha, onde fazia um breve intervalo depois de ter acabado de completar um safari de duas semanas, na concessão de Ugalla. Com Valéry Giscard d’Estang, o antigo presidente da França.
Nenhuma experiência, anterior ou posterior, se aproximou daquilo que tivemos de suportar. Não podia ter previsto o selvagem safari de depravação e de enganos que jaziu à nossa frente. Entontecida pela dor e pelo choque, a minha mente retroceu, no tempo, mergulhada em algo semelhante a uma coma, até àquele dia de 1936 em que desembarquei na Beira. Moçambique, e que agora se encontrava por baixo do jacto, mas a toda uma vida de distância”.
José Martins